É proibido viver

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A memória sempre falha, ainda mais com a ajuda do tempo, não me permitiu fazer grandes comparações entre a Guarapari que vi em setembro de 2009 e aquela que eu conheci há quase vinte anos, ainda fedelho. Não me lembrava se já havia tantos prédios modernos à beira-mar, por exemplo, entre tantas outras coisas que parecem diferentes. Mas uma coisa realmente não havia naquela época, e foi uma decepcionante surpresa descobri-la.

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Faça-se a luz, o chuveiro, a tomada…

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É estranho, sim: como é que só no final, depois de tanta coisa que precisou de ferramentas, é que se fala em instalação elétrica? Pois é. Culpa das luminárias e dos espelhos, das plaquinhas de plástico que emolduram tomadas, interruptores, etc. Não adianta instalar isso tudo antes de pintar a casa — e de nada adianta gastar uma bolada comprando o material elétrico antes da hora, como eu já fiz. As ferramentas, o pessoal liga com uma gambiarra nos fios que foram usados para a betoneira. Essa fase também exige generosidade na escolha de materiais, como fios, disjuntores, etc. Em hipótese ALGUMA se deve subestimar o que o engenheiro recomendou e comprar fios mais finos e disjuntores de maior potência, e as mudanças no projeto original devem ser muito bem discutidas com o eletricista responsável, para que ele já instale a fiação de acordo com as novas exigências.

  • Comprar cabos flexíveis grossos, também conhecidos como Sintenax, para ligação dos quadros de distribuição ao relógio. As cores são importantes: compre n do verde, n do azul e 3n do preto. Os cabos com bitola de 10mm são usuais para casas pequenas; 16mm para casas grandes; 25mm para prédios. Se você acha que o projeto exagerou na bitola dos cabos (como aconteceu comigo), discuta isso com o responsável técnico. E lembre-se que de nada adianta ter cabos grossos do relógio ao quadro de força, se os cabos que ligaram o poste ao relógio forem mais finos.
  • Comprar os fios de acordo com as cores e espessuras definidas no projeto, fita isolante (comece com 5 rolos de 20m: por mais fita isolante que se tenha, o pessoal da obra SEMPRE vai usar tudo e ainda vai pedir mais), graxa ou vaselina para passar os fios pelos conduítes, luminárias de teto e parede, lâmpadas, fita crepe.
  • Comprar os interruptores, tomadas, botões, etc. Os engenheiros costumam usar designações para os interruptores como “simples” e “three-way”, que são diferentes das designações dadas pelos fabricantes. Interruptor simples é… interruptor simples. Já o 3-way é encontrado como “interruptor paralelo”, e serve para ligar ou desligar uma lâmpada ou equipamento que pode ser comandado também por outro interruptor. O “interruptor intermediário” é também chamado de “4-way” e “chave cruz”, e é usado principalmente em escadas e corredores longos: com ele, é possível apagar uma lâmpada e acender outra em seqüência. Existem também os “interruptores bipolares”, simples ou paralelos, que podem ser usados, por exemplo, num banheiro sem janelas, em que o comando da luz também deve acionar um exaustor.
  • Comprar os disjuntores, conforme definido pelo projeto. Existem os de padrão DIN, normalmente brancos e em amperagens que não são bem do padrão que os engenheiros brasileiros usam; e os disjuntores NEMA, aqueles tradicionais pretos e um pouco maiores que os DIN. Cada fabricante obviamente defende seu padrão como o melhor, mas na prática, por enquanto, não há vantagem em um ou outro. A importância da escolha do padrão está ligada à escolha do quadro de distribuição que foi comprado, pois os disjuntores NEMA e DIN têm encaixe e parafusamento diferentes. Os DIN ocupam menos espaço no quadro: um quadro para 12 disjuntores NEMA pode abrigar 16 disjuntores DIN, com o uso de um adaptador, normalmente incluso no quadro. NUNCA se deve comprar disjuntores de capacidade maior do que a estabelecida no projeto, e também é fundamental verificar se existe um disjuntor exclusivo para cada equipamento de maior potência, como chuveiros.

Exigir do eletricista que todos os pares de fios que ligam tomadas e interruptores sejam identificados nas pontas (com fita crepe ou alguma tinta). Isso facilita muito a manutenção posterior, caso necessário.

Por onde começar?

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O mestre de obra passa a impressão de que você já devia comprar tudo logo de uma vez, menos o cimento, que estraga em 30 dias. Você tem a sensação de que já deve definir, antes mesmo de sair do chão, o material que vai usar nas janelas. Em que hora você deve se preocupar em comprar as portas? E que diabo de peça é essa que o pedreiro pediu pra poder montar o vaso?

Na construção da minha casa, eu tive que terminar uma parte dela primeiro, e isso me serviu de orientação básica para a construção do resto da casa. Em linhas gerais, tanto faz o tamanho da casa e o número de andares — os princípios são os mesmos, apenas as quantidades são diferentes. A organização da obra vai da necessidade de cada um. Uma pessoa, por exemplo, pode querer terminar todo o piso térreo, para já morar nele enquanto constrói os outros andares. Ou se pode também querer erguer a casa inteira até o telhado só na alvenaria, para depois passar à etapa de reboco e instalações, por exemplo.

Mas, posso dizer com a minha atual e ainda pequena experiência, o importante é começar. Entre tudo que é necessário para isso, estão a paciência, uma boa cautela financeira, muita organização, e uma boa preparação psicológica.

 

Antes de começar

Você certamente já tem uma idéia de como é a casa que você quer, não é? Se você é nerd como eu, certamente já tentou até mesmo esboçar algumas plantas baixas e maquetes em 3D com softwares de arquitetura como Floorplan, 3D Home, Chief Architect e outros. Ou talvez tenha apenas feito alguns desenhos em papel mesmo. Mas, se você não é tão sonhador assim, talvez você tenha simplesmente adorado uma casa que viu numa revista de arquitetura, e resolveu copiar o projeto dela igualzinho.

Pois bem: ótimo que você já saiba o que quer, mas contrate um arquiteto. É caro? É sim. Muitos se acham os próximos Niemeyers e você poderá ter a sensação de que o arquiteto quer te cobrar preço de um projeto de shopping center pela sua casa. Mas pesquise, encontre um arquiteto experiente e sem frescuras, e isso vai valer MUITO a pena. Se você já tiver os tais esboços que mencionei, ótimo, não se envergonhe e mostre a ele as suas idéias — você pode pensar que elas parecerão ridículas para um arquiteto de verdade, mas elas darão a ele uma boa noção de o que é que você está imaginando. Deixe que ele faça propostas, discuta com ele o que você aceita ou não aceita, o tipo de acabamento que você imagina, até mesmo um pouco dos seus planos futuros, como ter um atelier, um laboratório de fotografia ou um barco. No fim das contas, você vai ter em mãos um projeto já bastante definido, corretamente dimensionado, e que vai poder ser executado praticamente sem grandes mudanças durante a obra — ou seja, só isso já vai economizar tudo que você pagou ao arquiteto. Mais ainda, um projeto completo já vai vir com as plantas das instalações de água, elétrica, telefone, etc., e talvez até mesmo algum detalhamento sobre o acabamento, as escadas da casa, as bancadas de pias, etc. Definitivamente, não se faz uma obra só a partir de uma planta baixa.

Existem em alguns sites e nos classificados dos jornais alguns arquitetos que vendem, a preços bem mais em conta, projetos completos já prontos. É como se fossem “projetos de casas pré-moldadas”, e, mesmo sendo algo bastante improvável, vamos supor que você encontre um que considere perfeito. Ainda assim, você vai precisar do cálculo estrutural, que é tão ou até mais importante que o projeto em si. Parece compensador, fácil e barato fazer uma fundação comum, subir colunas de ferro e concreto acompanhando a espessura dos tijolos, mas se você fizer isso você rapidamente vai se arrepender. Normalmente o projeto de fundações e cálculo estrutural é feito por um engenheiro especializado, que possivelmente deverá ser pago à parte do projeto arquitetônico. Vale a pena: não tente economizar aqui.

 

Dinheiro

Falando em economizar, dinheiro é sem dúvida o grande problema de qualquer obra. Na verdade, obra só é mais barata do que comprar uma casa pronta (e, mesmo assim, nem sempre). Parece algo impossível de se realizar no começo, mas as seguintes dicas podem ajudar:

  • Antes de começar, junte o máximo de dinheiro que puder, pelo máximo de tempo que for possível. Faça a maior economia da sua vida e, com isso, evite ao máximo, e enquanto puder, cair na tentação de pegar um empréstimo bancário, ou pagar as contas da obra com cartão de crédito em prestações a perder de vista. Você sabe tanto quanto eu que banco nenhum é bonzinho e os juros não são brincadeira. O que acontece se você cair na tentação de pegar um empréstimo já no começo da obra? Tudo fica parecendo maravilhoso no começo: você tem bastante dinheiro para a fundação, a mão de obra, etc. Só que aquele montão de dinheiro vai embora rapidinho, e então você vai se ver devendo as calças a um banco, e sem dinheiro para comprar mais material e pagar a mão de obra. É praticamente a falência, e eu já cansei de ver gente vendendo casa pela metade porque não deu conta de pagar. Por isso, deixe para pegar um empréstimo, se for realmente necessário, só no fim da obra, na fase de acabamento, que é realmente a mais salgada mas pode esperar caso o dinheiro acabe antes da hora. E, se possível, antes de ir a um banco procure um amigo ou parente que tenha dinheiro e que confie em você. Qualquer coisa é melhor do que cair na ciranda do mercado financeiro!
  • Divida a obra por etapas e já planeje de antemão algumas paradas estratégicas para “respirar” financeiramente. Não tente tocar a obra sem ter uma confortável reserva de dinheiro que lhe permita comprar material “de emergência” — coisas como 20 sacos de cimento ou duas latas de verniz para ontem, coisa que acontece o TEMPO TODO numa obra, e que NUNCA vai te custar só dez reais. Algumas fases da construção são extremamente sugadoras de capital — o telhado, por exemplo — e depois delas é altamente recomendável você parar a obra, dispensar o pessoal por pelo menos uns 3 ou 4 meses, tentar economizar o máximo que puder do seu suado salário, e só então retomar a construção. Se você não fizer isso, tenderá a cair na tentação de pegar um empréstimo, e aí a bola de neve começa a rolar.
  • Onde que dá para economizar? Nos próximos artigos, tentarei indicar, sempre que possível, o que pode ou não sair mais barato. Entenda que uma casa é um tremendo patrimônio, que poderá ser seu pelo resto da vida, e por isso muitas vezes vale a pena gastar um pouco a mais e ter algo de qualidade que não vai lhe causar problemas tão cedo — e muitas vezes esse “um pouco a mais” é realmente pouco. Por outro lado, algo mais caro não é necessariamente de melhor qualidade, e muitas vezes a gente não percebe que, além do gasto inicial com a compra do material, também é preciso pensar no custo da mão-de-obra para trabalhar com esse material e, principalmente, na manutenção futura que poderá ser necessária. Você vai ver que atualmente tem muita coisa em construção que é pura esbanjação.

O jornalismo pós-diploma

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Ainda estou para viver o dia em que um criminoso, autor das maiores e mais inimagináveis barbáries possíveis às mãos de um homem, vai dizer que é bem tratado, confortável e respeitado em uma delegacia ou um presídio. Que foi detido com fineza e tranquilidade, sem violência, interrogado com justiça e em vigilância dos direitos humanos universais. Porque até hoje só ouvi o contrário: que não estava fazendo nada e já levou um tabefe antes mesmo de responder qualquer pergunta, que o delegado não deixou ele falar, que a cadeia é superlotada e fedorenta, etc etc etc. Não é que abusos assim não aconteçam, ou que tais denúncias não devam ser consideradas e apuradas; mas é claro que a tendência — até natural — é que o "elemento" esteja sempre querendo desqualificar a força que o reprimiu.

Numa votação surpreendente no dia 17 de junho de 2009, o Supremo Tribunal Federal derrubou a obrigatoriedade da formação específica e do diploma para o exercício do jornalismo. A ação que buscava isso foi movida pelo Sindicato de Empresas de Rádio e Televisão de São Paulo (Sertesp), com base no argumento de que a exigência do diploma foi criada na ditadura militar como uma forma de oprimir a livre expressão, algo que seria incompatível com os princípios da Constituição de 1988. Quem relatou o processo foi o polêmico presidente do STF, Gilmar Mendes, e apenas o ministro Marco Aurélio de Mello votou contra o pedido da Sertesp. Argumentou Gilmar que “o jornalismo e a liberdade de expressão são atividades que estão imbricadas por sua própria natureza e não podem ser pensados e tratados de forma separada”, e que o jornalismo é tão somente “a própria manifestação e difusão do pensamento e da informação, de forma contínua, profissional e remunerada”. Disse o ministro Cezar Peluso que o curso de Comunicação Social não é uma garantia contra o mau exercício da profissão, e que do jornalismo não se exige "garantia contra danos e riscos à coletividade, aferição de conhecimentos suficientes de verdades científicas exigidas para a natureza do trabalho, ofício ou profissão" que justificariam a exigência de diploma.

O Brasil é mesmo um país de contradições e estranhos contrastes. Pensam os ministros do Supremo que não se pode exigir qualificação especial de quem tem a responsabilidade de informar e ajudar a construir raciocínios de centenas, milhares, milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, tente alguém construir na própria casa um quarto a mais, sob o qual apenas estará si mesmo, e para isso comprar os mesmos materiais que já usou na casa, contratar pedreiros e os orientar para o serviço. Aparecerá em poucos dias, sabe Deus como e por fofoca de quem, a fiscalização do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura, ameaçando o cidadão com pesada multa e processo judicial por "exercício ilegal da profissão". Existem cada vez mais regulamentos, propostas e leis em todas as esferas do poder público para reconhecer, normatizar e exigir qualificação comprovada de profissionais como acupunturistas, esteticistas, optometristas, vendedores de churrasquinho e cachorro-quente na rua, vigilantes, porteiros, flanelinhas e até prostitutas. Mas jornalista, segundo o Supremo, qualquer um pode ser.

Gilmar Mendes, o relator do processo e presidente do Supremo, é declaradamente contrário aos mandados de segurança que são impetrados por bacharéis em direito que argumentam não ser necessária a aprovação no exame da Ordem dos Advogados do Brasil para o exercício da advocacia. Mas sobre o jornalismo não é surpresa que a situação tão parecida seja vista de forma oposta. Dentro dos rígidos limites impostos pelas empresas jornalísticas — que não querem de jeito nenhum arranjar encrenca com o mesmo Judiciário que julga seus inúmeros processos trabalhistas e comerciais –, os jornalistas colocaram Gilmar Mendes sob suspeita pela estranha forma com que concedeu dois habeas corpus sucessivos para libertar o banqueiro Daniel Dantas, investigado por corrupção e formação de quadrilha, com direito a uma enxovalhada pública ao juiz paulista Fausto de Sanctis, que havia expedido a prisão do banqueiro. O mesmo ministro anteriormente espalhara que teria tido seus telefones no Supremo grampeados, o que em momento algum se comprovou, e em episódio posterior exigiu que a TV Câmara tirasse da programação uma edição do programa "Comitê de Imprensa" em que o jornalista participante Leandro Fortes o criticava. Aliás, também na TV Câmara, uma reportagem minha sobre casos de impunidade e morosidade do Judiciário causou uma queixa do ministro à então diretora da TV. Diante destes e de outros episódios em que demonstrou sua pouca amistosidade com os jornalistas, só se podia esperar que de Gilmar Mendes viesse um parecer pela desmoralização, desqualificação e enfraquecimento da imprensa brasileira. É como o bandido dizendo que foi torturado na delegacia.

Surpresa foi o colegiado quase inteiro referendar e embasar tamanha esparrela, e confundir o exercício do jornalismo com a liberdade de expressão individual. Como bem lembrou o advogado da Federação Nacional de Jornalistas na audiência, quase todos os jornalistas e os veículos de comunicação sempre convidaram e receberam bem cidadãos comuns, especialistas e celebridades que desejassem expressar seus pontos de vista e participar da elaboração do produto jornalístico, nas formas de artigos, cartas dos leitores, debates e entrevistas. Sem qualquer necessidade de formação jornalística. Com exceção dos jornalistas que escrevem colunas e artigos, os repórteres, editores e assessores de imprensa não são donos das opiniões e ideias que divulgam. Elas são dos personagens, dos entrevistados que são ouvidos para a elaboração do texto jornalístico.

Ao jornalista cabe ter a competência e o discernimento para organizar essas opiniões e ideias de forma que elas sejam fácil e exatamente entendidas pelo público — e é daí que vem a necessidade de uma formação especial. A faculdade de Comunicação Social, e a especialização em Jornalismo em particular, incute nos futuros profissionais a visão técnica da comunicação e a responsabilidade social que ela exige e carrega em si, em princípios como o interesse público, o contraponto de opiniões, a repercussão sistematizada dos fatos, a comparação balanceada de informações. Engloba o tratamento científico e mercadológico da comunicação de massa, em aspectos que vão da cadeia produtiva da notícia e das peculiaridades das tecnologias de captação e difusão até os efeitos psicológicos e sociais que uma imagem, uma certa composição gráfica ou uma simples troca de palavras sinônimas pode causar. Estes e os vários outros temas da academia jornalística vão muito além de "uma sólida cultura, domínio do idioma, formação ética e fidelidade aos fatos", que o ministro Ricardo Lewandowski apontou sem propriedade como únicos requisitos para o exercício do jornalismo. Não havendo todo esse embasamento e o consequente comprometimento técnico-científico com a comunicação, corremos agora o risco de ver cada vez mais gente se dizendo jornalista apenas para participar das bocas-livres do high society ou para entrar de graça em festivais de cinema e shows. Ou para criar jornaizinhos e jornalecos sem qualquer credibilidade, com o único propósito de angariar dinheiro com anúncios de pequenos comerciantes. Ou, pior ainda, para usar o incontestável poder da comunicação para fins de auto-promoção pessoal ou política, exercendo favorecimentos, pressões e chantagens injustas e invisíveis à maior parte da audiência.

A liberdade de expressão a que se refere a Constituição é a das manifestações em público, do direito de imprimir em casa panfletos com críticas e opiniões e distribuí-los nas ruas, de falar ou não falar perante autoridades, de criar sites na internet sobre qualquer assunto ou ideologia sem risco de censura, entre várias outras possibilidades. Essa liberdade de expressão não significa necessariamente que tais manifestações devam ou sequer possam ser feitas por meio de veículos de comunicação de massa privados ou públicos. Esse tênue limite estabelecido pelo bom senso é o mesmo que nos impede de achar correto que qualquer açougueiro hábil possa exercer sua destreza em uma mesa de cirurgia, ou que um bom taxista possa ser companheiro de Felipe Massa na Ferrari. A confusão proposital foi uma argumentação mais do que cínica do Sertesp para embasar o processo, e pode ser um tiro pela culatra. Porque se a liberdade de expressão a que todo brasileiro tem direito inclui ter acesso livre aos microfones e teclados dos veículos de comunicação de massa, como concordou e concluiu o Supremo, as empresas de comunicação devem doravante ser obrigadas a garantir esse direito a todo e qualquer cidadão, de forma irrestrita, não é? Eu realmente quero saber o posicionamento do Sertesp quanto a isso, especialmente quando algum cidadão ciente dos seus direitos protocolar um mandado de segurança com este objetivo.

Certamente as empresas de rádio e televisão e os jornalões não contavam com essa interpretação colateral que ora surge. Na verdade, elas querem que a liberdade de expressão que se lixe. A intenção imediatista de tais empresas é permitir a contratação de "jornalistas" a preço de banana, que um profissional decente de nível superior jamais aceitaria. Também pesa no pedido a descoberta — tavez mesmo a imposição — de que o "povão" gosta é de artista apresentando programas e reportagens. Afinal, esse negócio de televisão educativa e combate à baixaria é coisa de teórico intelectual de academia. Já pensou a audiência de um Jornal Nacional apresentado pelo Tiririca e pela Cláudia Leitte?

Mas se "a regra geral é a liberdade de ofício", como disse em seu voto o ministro do STF Celso de Mello, que isso seja estendido a todos, pois. Para a sociedade é suficiente que as universidades se resumam aos cursos de Medicina e de Engenharia Civil. Para ser arquiteto basta saber desenhar, e o engenheiro que se vire com os cálculos. Qualquer pessoa que nasceu e cresceu na roça tem conhecimento e vivência para ser considerado agrônomo. Um torneiro mecânico criativo e bom de desenho tem o que é essencial para ser projetista de carros, e qualquer hackerzinho de 16 anos pode dar um baile em bacharelados em Ciência da Computação. Para ser político… bem, para isso há um bom tempo não precisa de nada. Toda a legislação brasileira é disponível em livrarias, bibliotecas e até na Internet, e visto que o direito à petição é de todos, não há necessidade de formação específica para advogados e juízes — aliás, interessante é lembrar que para ser ministro de um tribunal superior a Constituição não exige carreira judiciária, e sim apenas "notável saber jurídico". Então, parafraseando o ministro Lewandowski, basta ter o notável saber jurídico, ter senso de justiça, domínio da língua e formação ética. Muito concurseiro tem isso tudo de sobra — e, como a mesma achincalhada imprensa já mostrou à sociedade, até mais do que alguns de nossos superiores magistrados.

Incompetência e autoritarismo

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Foi iniciativa do Poder Executivo, mais precisamente do Ministério da Justiça sob a batuta do petista gaúcho Tarso Genro, a idéia de proibir completamente a venda de bebidas alcoólicas em comércios de beira de estrada. A medida provisória com tal propósito causou tremendo rebuliço e uma repercussão tamanha que o próprio governo chegou a voltar atrás na idéia.

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Moral e bons costumes

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Uma exposição que seria realizada no Salão Negro da Câmara, intitulada “Exposição Heróis”, já estava toda montada quando alguém gritou por causa de uma foto da atriz travesti Rogéria em que, dizem, ela/ele aparecia seminua. Francamente, a dita transformista já deixou os dias de glória faz é tempo, homossexualismo já é tema de novela, e duvido que alguém fizesse tanta questão de ver essa foto ou que alguém se escandalizasse com o que visse (no aspecto de novidade ou de espanto, não entro no mérito de beleza). Mas alguns deputados, sob o anacrônico argumento de “ofensa à família brasileira”, suspenderam imediatamente a abertura da exposição. Só deixariam o evento prosseguir se fosse colocada uma tarja preta sobre a seminudez de Rogéria.

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Meu filho vai ser corrupto

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Num período de aproximadamente um mês, o cidadão brasileiro viu um homicida confesso ser laureado promotor vitalício e uma juíza federal ser promovida apesar de suas ligações com um traficante colombiano. Pode ter vindo daí a aparente indiferença ao vermos o presidente da uma das instituições máximas da República ser inocentado das várias acusações de corrupção, mentira e uso indevido do poder, por 40 de seus colegas e, por que não dizer, certamente pares e similares em muito além do que podemos ver.

Desde que surgiu a acusação de ter as pensões da filha bastarda pagas por um lobista de uma grande empreiteira, o senador Renan Calheiros parece ter passado Araldite 24 Horas na cadeira da presidência do Senado. Bem confiante, recusou-se a renunciar tanto ao cargo quanto ao mandato. Provou, ao frigir dos ovos, que tanta confiança tinha razão de ser. Alegou e continua alegando ser inocente. Ok, então vamos presumir que não constituam provas definitivas de culpa  todos os documentos que foram descobertos pela imprensa, os personagens que confirmaram histórias cabeludas sobre o senador alagoano, nem os documentos que o próprio Renan apresentou e foram considerados falsos pela perícia da respeitável Polícia Federal. Mesmo que tudo isso ainda não forme evidência suficiente de corrupção e crimes, será que cabe a um presidente do Senado Federal, um político poderoso que está sempre na base de apoio de qualquer governo que ocupe o Palácio do Planalto, o simples fato de ser acusado disso tudo? Já não seria motivo suficiente para que, por vontade própria ou por seus colegas de Parlamento, deixasse a presidência, e fosse afastado ou mesmo licenciado do mandato, para que, despido de qualquer carapaça política, fosse investigado a pente fino, como cidadão comum, para que assim fosse cabalmente atestada (ou não) sua alegada inocência??

Sim, era para ser assim. Se ele mesmo, Renan Calheiros, tivesse a hombridade e a honradez de se dispor a isso. Se os 40 senadores que o absolveram tivessem um pouco de vergonha na cara e demonstrassem um mínimo de preocupação com a imagem da política brasileira e do próprio Senado. Se, na jogatina dos partidos e blocos políticos, o respeito ao cidadão fosse considerado uma carta importante. Se os crimes que foram atribuídos ao senador causassem tanto interesse público quanto o crime da novela das oito, e se o próprio cidadão se preocupasse com algo mais que a mera sobrevivência com um pouquinho de diversão.

 

Maior que a lei maior

Mas não. Renan preferiu peitar todas as acusações, argumentar que tudo era fruto de perseguição da imprensa, e optou pelo caminho notavelmente seguro de se submeter aos seus pares — a maioria deles, como ficou provado, de caráter e atos tão duvidosos quanto os do julgado. Em uma votação secreta, em que todos os participantes, eleitos pelo povo, têm o direito de não dar satisfação alguma ao povo que os elegeu. E, para deixar o acusado ainda mais tranqüilo, o Regimento do Senado ainda determina que tal votação tem que ser hermeticamente fechada e protegida dos olhos da sociedade. Em outros termos: "que se dane quem votou em nós, aqui a gente faz o que a gente quiser". Tanto é que os deputados que conseguiram na Justiça uma liminar para acompanhar a votação quase foram impedidos (à força) de entrar no Plenário pelos funcionários da segurança do Senado — em uma demonstração bárbara de ignorância que nos remeteu imediatamente ao coronelismo ainda atual. E os mesmos deputados foram violentamente censurados por alguns dos senadores, durante a tal sessão de votação, quando saíram do Plenário e comentaram para a imprensa o que estava acontecendo lá dentro. Alegavam os ditos senadores que, pelas normas do Regimento Interno do Senado, exige-se sigilo. Como se fosse o Regimento do Senado maior do que a própria Constituição Federal, que garante, em seus princípios, a liberdade de expressão, a inviolabilidade das declarações de um parlamentar, a proibição da Censura e o direito do cidadão à transparência do poder público.

Absurdo por absurdo, o corporativismo oficializado e extremado era exatamente o trunfo que Renan Calheiros sabia que tinha desde o começo — por isso a confiança e a tranqüilidade que demonstrou por todo esse tempo. Do lado de fora do Congresso, cerca de dez gatos-pingados seguravam uma faixa preta com o dizer "Fora Renan" — taí a surpreendente mobilização da sociedade brasileira diante de um caso de tanta magnitude. Um mínimo de cidadania que o brasileiro tivesse certamente teria provocado uma manifestação decente na Esplanada dos Ministérios. Talvez até tivesse mudado o placar da votação, se os próprios senadores também tivessem esse mínimo de cidadania; mas se não o tivessem, esse mesmo grão de cidadania teria causado uma invasão do Senado, com um merecido quebra-quebra da-que-les. Deveria a população mostrar que não precisa de um Senado como esse, que, apesar de seus quase 200 anos de tradição, tem se mostrado cada vez menos útil à organização do Estado e representativo da sociedade, e ainda assim não tem o menor pudor de se mostrar como a maior pizzaria do país.

Mas estamos no Brasil, o país em que o malandro é um ícone nacional e bandido vira herói de cinema. Em que deputados mensaleiros e sanguessugas também foram absolvidos e reeleitos. O país em que o povão não se importa com nada, e até acha bonito ouvir o nome do senador em que votou no rádio — sem entender patavinas sobre a tal "improbidade administrativa" e "tráfico de influência" que o rádio diz que o tal senador cometeu. Um país em que, no fim das contas, é mais barato, mais fácil e mais seguro viver na ilegalidade do que na honestidade; e é nos altos postos dos três poderes da República que estão os mais ilustres exemplos.

Por tudo isso é que o episódio acontecido na tarde desta quarta-feira, 12 de setembro de 2007, levou-me a pensar que um filho meu terá mais sucesso e tranqüilidade no Brasil se, em vez de ser honesto e íntegro, resolver ser corrupto. Nada de ficar esquentando a cabeça com esse papo de cidadania, ideologia, ética. Um dia, quem sabe, ele pode até se tornar um político importante e presidente de alguma coisa.

Mais reparos e improvisos

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NADA até agora me deu tanto problema e preocupação nesse Maverick quanto os freios. Depois de finalmente encontrar um cilindro-mestre de Opala que servia — na marra, mas encaixava — no hidrovácuo original, o pedal do freio ainda continuava baixo e muito fraco. Uma tentativa mal-sucedida de retirar o parafuso sangrador da pinça dianteira esquerda até fez com que o freio ficasse mais firme, mas longe de ser suficiente e tranqüilizante.

Numa sexta-feira de folga resolvi atravessar o DF e ir ao famoso "setor H Norte" de Taguatinga, cidade-satélite de Brasília. A oficialmente chamada quadra QNH é repleta de oficinas, ferros-velhos, lojas de peças de tudo que se possa imaginar. Eu queria mesmo era procurar algumas peças do Maverick para as fases seguintes da restauração, como um volante original, mas a preocupação com o freio foi maior e tratei de procurar logo algum lugar que pudesse dar um jeito nisso.

Antes, porém, segui a dica que um colega de trabalho havia dado no dia anterior. "Um cunhado meu comprou um Maverick uma vez e levou a uma loja que fica na QSC, na rua do antigo Clube Primavera, que é especializada em Maverick e Landau! Procura lá que o pessoal te diz onde fica!". Achei a dica interessante e fui lá antes de cair no bendito Setor H Norte. Com um pouquinho de dificuldade, encontrei entre algumas casas uma pequena oficina cujo painel de fachada tinha uma foto de um Maverick bem grande. Dentro dela, dois Mavericks sendo remontados e um Landau LTD — só podia ser aqui!

Desci, comecei a perguntar sobre o trabalho desses, e logo apareceu um cara meio gordinho que era o dono da oficina. Disse a ele que estava restaurando um Maverick e levei-o para ver. Ao perguntar o nome, confirmei a suspeita que já tinha — era o famoso Téo do Maverick, dono de várias peças que se pode encontrar à venda no MercadoLivre! Fiquei feliz por encontrar uma das "autoridades nacionais" em Maverick.

Mais feliz ainda pelo que ele disse sobre o meu carro. "Pagou barato", ele disse, quando falei o preço, já meio envergonhado, por ter me sentido meio otário diante do tanto de problemas que o carro já apresentou. "Meu amigo, só de ter essas duas letrinhas mágicas, GT, o preço já sobe", disse ele diante da minha surpresa. Ficou doido com a placa, que tem o mesmo ano do carro. Em uma olhada geral, disse que o meu Maveco tá quase todo original, em ótimas condições, excelente para restaurar e rico em detalhes de acabamento que são raros. "Esse pára-brisa degradê era de fábrica. Hoje é raríssimo encontrar um Maverick que tenha", disse. Apontou que também é raridade o hidrovácuo, original, que ainda era opcional em 1977. Listei alguns dos problemas, como a dificuldade de pegar e as agruras com os freios, e ele apontou logo onde que poderia arrumar tudo, em auto-elétricas, torneadores e oficinas que ele mesmo usa para os carros que pega para restaurar.

 

Alternador 

Cheio de orgulho e animado pelas palavras de Téo, passei logo na auto-elétrica que ele recomendou. O eletricista fez alguns testes e descobriu que o alternador estava gerando apenas 12 volts, redondinhos. Não era um problema no regulador de voltagem, também. Embora o circuito elétrico do carro seja de 12 volts, o alternador precisa gerar algo em torno de 13,5 para poder, além de carregar a bateria, manter o resto da parte elétrica funcionando. Porém, uma revisão no alternador levaria umas três horas, e por isso preferi ir resolver o problema dos freios primeiro, e prometi voltar.

Pulando a parte que não interessa por enquanto: voltei para casa à noite e antes precisei passar no trabalho — onde, aliás, um guardinha ficou doido com o carro e perguntou se eu não queria vender, o que sempre soa como elogio 🙂 Como eu já esperava, o carro só pegou de volta no tranco, após ser empurrado. Ainda peguei um congestionamento miserável. No caminho notei que as luzes do painel foram ficando mais fracas e, quando cheguei em casa, notei os faróis também fracos e amarelados. Com umas aceleradas fortes no motor eles acendiam mais. Típico problema de carga do sistema elétrico.

Na manhã de sábado eu quis levar o carro a uma auto-elétrica perto de casa, mas o carro se recusou terminantemente a pegar. Notei que a coisa estava séria quando liguei o meu Golzinho do lado do Maverick e liguei um cabo de chupeta entre as baterias dos dois. Mesmo com a chave do Maverick desligada, os cabos faiscaram quando os liguei na bateria. A luz de óleo permaneceu acesa, porém fraca. O carro não pegou de jeito nenhum e os cabos esquentaram a ponto de começar a soltar fumaça até que eu os desliguei correndo. Imaginei logo que havia um curto-circuito em algum lugar. Medi a tensão na bateria — menos de 6 volts! Desliguei os terminais e deixei quieto.

Na tarde de domingo tirei a bateria do carro e a coloquei em um carregador. Na segunda-feira de manhã, medi a tensão (11,86 volts, normal), instalei de volta, mas o motor de partida não fez nem fez "tchof". Empurrei o carro até a ladeira da esquina e só no finzinho dela, depois de muita tentativa, o motor pegou no tranco. Levei o carro à auto-elétrica.

O alternador, como eu suspeitava, estava com as escovas gastas — é um desgaste normal de uso em qualquer carro. O motor de partida estava com problema no solenóide, também chamado de "automático". E a dificuldade de pegar também era causada por má regulagem do carburador e do ponto da ignição — regulagens estas que eu já tinha mandado fazer quando o carro ficou um mês parado na outra oficina!! Pode?? O ajuste foi feito e a partida melhorou bastante

Mas o meu Maverick ainda tem um problema estranho para o qual não consegui solução. Depois que o carro roda um bocado, se eu parar e desligá-lo é preciso esperar mais um tempo para dar partida de novo, senão o motor de partida simplesmente roda "pesado", se arrastando, e não faz o carro pegar de jeito nenhum. Inclusive, ele chega a "travar ligado": mesmo desligando-se a chave, o solenóide continua ativado, com o motor de partida aquecendo rapidamente e sugando a bateria — em um episódio desses tive que correr e desligar os fios da bateria porque o motor de partida já estava começando a soltar fumaça! Mandei trocar o cabo que ia da bateria para ele — estava remendado… — mas isso também não resolveu o problema.

 

Freios: o mais longo sofrimento

Bem, voltando à visita ao Setor H Norte… A Torneadora Ceará, que me fora indicada pelo Téo do Maverick, cobrou R$ 20,00 para tirar da pinça de freio esquerda o pedaço do parafuso sangrador que quebrou e para soldar no hidrovácuo um novo parafuso de fixação do cilindro-mestre, no lugar do que estava espanado. Mas eu tinha que levar as peças já desmontadas. Apesar de estar no antro das oficinas de Taguatinga, não foi exatamente fácil encontrar uma que desmontasse as peças ali na hora. Mas achei uma que cobrou R$ 60,00 para desmontar e montar as peças de volta.

Pechinchei, mas depois do serviço feito eu até paguei por iniciativa própria o valor cobrado inicialmente. Porque foi um trabalho do CÃO, cheio de problemas, que começou por volta de 12h30 e só foi terminar às 17h. O torneiro mecânico até que resolveu tudo bem rapidamente — conseguiu, finalmente, tirar a bosta do parafuso sangrador, ainda que isso tenha quebrado uma borda da rosca, mas ainda sobrou rosca suficiente para que um novo sangrador se fixasse bem. O problema maior foi com o hidrovácuo. Primeiro ele soldou um parafuso mais comprido que o original, e, por conta da falta de espaço para o cilindro-mestre entre o hidrovácuo e a coluna da suspensão dianteira, foi preciso serrar essa sobra.

Dificílimo encaixar o cilindro-mestre de volta e, quando o mecânico conseguiu, o parafuso soldado quebrou. Levei de volta ao torneiro, ele soldou outro, mais caprichado, e eu já achava que o hidrovácuo não sobreviveria. Os mecânicos da oficina também amassaram um pouco a coluna da suspensão, na marreta, para facilitar o encaixe do cilindro-mestre. Não foi tanto assim, a ponto de causar algum desvio do amortecedor, e de fato permitiu que o encaixe ficasse bem melhor. Eles mesmos não acreditavam mais que o hidrovácuo funcionasse — até porque ele estava cheio de fluido, graças ao cilindro-mestre estragado que eu comprei, mas agora estou com um hidrovácuo funcionando beleza e segurando firme o cilindro-mestre.

Problema a menos de um lado, surge mais um no outro lado — a pinça de freio com o sangrador novo começou a dar um pequeno vazamento de fluido, na parte superior, bem onde suas duas metades se unem. Isso provavelmente foi causado pelo trabalho com maçarico para tirar o sangrador quebrado, que deve ter derretido as borrachas de vedação (que eu já havia trocado…). Suspeita que foi confirmada na internação do carro em mais uma oficina, em outubro — o mecânico abriu a pinça e trocou um dos pequenos anéis de vedação. Disse que estava bastante derretido mesmo. Pelo menos não me cobrou nada por essa troca.

Ainda assim, os freios do carro não estão com toda a força que eu gostaria, e sempre puxa para um lado — normalmente o direito, mas às vezes para o esquerdo. Um mecânico especialista em Maverick me disse que a instabilidade em freadas é um problema crônico do carro, mas acho que é uma questão de regulagem e de verificação da tubulação de freios. Ademais, preciso trocar os flexíveis das rodas dianteiras, que já estão um tanto ressecados. Isso seria feito na última oficina em que ele esteve, mas os flexíveis parecem simplesmente não existir no mercado brasiliense.

 

Medidor de combustível

A visita ao famoso Téo do Maverick ainda serviu para me esclarecer uma dúvida — a localização da bóia de combustível do Maverick. Fica no fundo do tanque, voltada para o diferencial do eixo traseiro. Eu já achava que o tanque não era mais original e não tinha bóia. Mas ela estava lá!

A visita que fiz ao primeiro auto-eletricista serviu para esclarecer não só o problema com o alternador, mas também que a causa da completa imobilidade do ponteiro de combustível estava no próprio painel de instrumentos. No meu fim de semana de "mexânico", limpei totalmente os contatos da bóia e testei com multímetro — e ela estava boa, variando a resistência se eu balançasse o carro, e dentro da faixa de 10 a 73 ohms que é apontada pelo manual de manutenção do Maverick.

Quando levei o carro ao outro auto-eletricista para consertar o alternador, pedi que ele olhasse também o problema do indicador de combustível — e ele disse que era algo bem simples: "Todo marcador tem uma parte por dentro com uma tinta, e essa tintinha tava soltando e emperrou o ponteiro. Foi só refazer essa tinta". Isso até fez o ponteiro andar, mas ele ainda ficou errático — ora indicava algo como um quarto de tanque, ora indicava três quartos, e nunca indicava a quantidade certa de gasolina, como pude comprovar ao encher o tanque. Levei o carro de volta e então o serviço foi refeito com perfeição, ainda na garantia. Vez por outra o marcador ainda insiste em tentar me enganar, mas depois ele volta ao normal.

 

Conta-giros

O conta-giros do Maverick também não estava mais funcionando. Depois da primeira tentativa de conserto do marcador de combustível, até percebi ele tentando dar sinais de vida por uns momentos, com o ponteiro indo lá em cima irregularmente, mas foi só uma vez. Eu mesmo desmontei o bicho para ver se havia algum componente solto, uma solda quebrada, algo assim. Apesar da simplicidade do circuito, não consegui localizar o problema visualmente.

Levei a uma loja especializada nisso, a Velogiro, na Asa Norte. Cobrou R$ 50,00. Quando fui buscar, percebi que o técnico não consertou o circuito original, mas sim pegou a placa de circuito impresso de um outro conta-giros de Maverick e botou no lugar. Até daria certo, não fosse o detalhe de eu ter esquecido de avisar que o meu Maverick é de 4 cilindros, e com certeza a placa do que ele arranjou era de um V8, porque a contagem de rotação parecia estar exatamente pela metade. Levei de volta, ele tentou regular, mas não conseguiu (tenho cá minhas dúvidas sobre a proficiência desses técnicos atuais, principalmente de Brasília).

No fim das contas, ele tirou de uma gaveta um circuito impresso novinho, ainda no plástico. Disse que é um circuito "genérico" vendido no mercado — bom saber que isso existe! Colocou lá, com uma pequena inversão nos fios de ligação do conta-giros, e agora está funcionando. Aferição? Isso a loja especializada em instrumentos não faz (!!!). Tenho a impressão de que o conta-giros não está bem calibrado, possivelmente contando menos rotações do que deveria, mas pelo menos o ponteiro está funcionando. Se alguém tiver um Maverick 4 cilindros com conta-giros funcionando e aferido, peço que por favor me diga algumas velocidades de referência (80km/h, 100km/h, etc) com as respectivas rotações.

 

Tambor de partida

Meu Maverick tinha um problema que eu descobri ser comum do carro: nem era necessária a chave para poder girar o tambor de ignição e dar partida! Aliás, se eu deixasse a chave na ignição, ela cairia no primeiro solavanco. Bastante arriscado isso, num país de bandidos, não é?

Um bom chaveiro resolveu o problema com uma relativa facilidade — relativa porque eu fiz questão de que ele tentasse manter o mesmo segredo que já era usado nas portas. Para quem não conhece um sistema de fechadura, lá vai uma explicação por alto: alguns pinos, com pequenas molas, ficam no cilindro, e outros pinos, de tamanhos variados, ficam no tambor que gira dentro desse cilindro. Quando se insere a chave certa, os pinos do tambor e do cilindro entram num alinhamento tal que permite que o tambor gire dentro do cilindro.

Então, o chaveiro tirou o volante, desmontou o cilindro de ignição e descobriu que os pinos estavam bem sujos e engripando um pouco, e no cilindro dois dos orifícios de pinos estavam com as bordas gastas — o que permitia que o tambor girasse mesmo se não houvesse o alinhamento dos pinos. Além disso, a chave estava bem gasta. Ele conseguiu uma chave virgem idêntica à original e refez os chanfros manualmente, com uma lima — a máquina copiadora simplesmente reproduziria o desgaste da chave original. Lavou os pinos com óleo desengripante e os recolocou no tambor com a chave inserida para manter o segredo original, usando a lima para fazer pequenos desbastes na chave para manter o alinhamento dos pinos. Obviamente, a chave original não serviria mais. Problema resolvido, com uma nova chave, ainda capaz de abrir as portas. Weehah!

 

Suspensão

Em outubro de 2007 levei o Maverick a uma oficina para trocar os amortecedores. O que é mais uma missão ingrata e infrutífera. Li em vários sites e fórums na internet dicas para adaptação dos amortecedores. Uma delas se provou bastante certa: os amortecedores dianteiros do Maverick são parecidos com os do Opala, com uma pequena mudança na forma de fixação. Os originais têm uma sapata inferior com dois parafusos fixos, e os do Opala têm uma sapata com rasgos dos dois lados. Então, para usar os amortecedores do Opala no Maverick, basta colocar dois parafusos de 8mm de diâmetro, com as respectivas porcas, nos tais rasgos.

Já os amortecedores traseiros do Maverick são um verdadeiro calvário, pois não existe nada semelhante no mercado nacional, e os amortecedores que existem à venda em alguns sites da internet e no MercadoLivre são importados da Argentina e vendidos a preço de OURO. No Maveco.com.br o par estava por R$ 240,00, enquanto um par de amortecedores para carros nacionais estava na média em R$ 80,00!!

Tentei seguir o caminho das adaptações e não me dei bem. Nos tais sites e fórums existem várias dicas — uns falam nos amortecedores da C10; um site falava até que os amortecedores do Passat antigo serviriam direitinho. Na Ipanema Auto Peças, especializada em peças para carros antigos, fui informado de que os amortecedores traseiros do Chevette Hatch são normalmente usados no Maverick, mas trabalhariam invertidos, de cabeça para baixo. Alguns dizem que isso não é bom, mas mesmo assim comprei, em outra loja. E o fato é que eles são bem mais compridos do que os originais e não serviram. Quem quiser comprar um par de amortecedores traseiros do Chevette, na caixa, novinhos em folha, por favor me escreva.

Mas, falando sobre adaptações, atenção: na oficina havia um Fusca (desse modelo Itamar) no elevador elétrico e pude observar que, curiosamente, os amortecedores traseiros dele são exatamente do mesmo tamanho dos do Maverick! A diferença é que, no Fusca, o amortecedor é fixado em cima e embaixo por anéis verticais, enquanto o amortecedor do Maverick tem um anel vertical em cima e um pino rosqueado embaixo. Na aparentemente possível adaptação, seria preciso soldar um parafuso de 8mm ou 10mm no lugar onde está o anel inferior. Como o Fusca tem motor traseiro, e por isso também é bem pesado atrás, creio que a carga dos amortecedores deve ser suficiente para o Maverick. Se alguém tentar essa adaptação, por favor me avise — afinal, peça de Fusca é moleza de achar e isso poderia representar o fim de um suplício para todos nós, donos de Maverick…

Aproveitando que o carro estava parado mesmo na oficina, mandei tirar os amortecedores originais e levei-os para a aparentemente única empresa de recondicionamento de peças do DF — a Recopeças, que fica no tal infame setor H Norte de Taguatinga. Ficou por R$ 90,00 com garantia de seis meses — ou seja, ainda um preço salgado, mas melhor do que R$ 240,00 mais frete. Dizem eles que não fazem só a troca do óleo dos amortecedores, mas também de todas as borrachas e válvulas da peça. Vamos ver.

A mesma oficina descobriu que os pivôs inferiores da suspensão não estavam bons. Tive que trocá-los e, após uma certa busca, encontrei um par, usado mas em bom estado, que me saiu por R$ 90,00. Depois descobri que ainda é possível encontrar esses pivôs inferiores no mercado, com preços que vão de R$ 70,00 a R$ 150,00. Já os pivôs superiores eu só encontrei pela internet, e um dia pretendo comprar um para substituir o que está na roda dianteira direita, que é de C10, fixado com um parafuso a menos. Serve, mas talvez seja mais passível de desalinhamento. Aproveitando a parada, também foi tirada a folga da direção (por regulagem) e foi feito o alinhamento. Com isso tudo, o carro ficou bem melhor de dirigir, sem aquela trepidação toda em pistas ruins, e puxando bem menos para os lados nas freadas.

 

 

Válvula de máxima vazando

 

Um pinga-pinga de gasolina bem em cima do distribuidor não é algo exatamente que deixe a gente dormir tranqüilo. Quando deixei o carro na primeira oficina, a válvula de máxima do carburador foi trocada, e o mecânico Beto me disse então que as roscas de fixação dos parafusos já estavam espanadas, o dono anterior tinha tentado meter parafusos maiores para compensar, e isso estava causando vazamento. No começo não parecia muita coisa, mas depois que o distribuidor começou a ficar melado de gasolina, vi que não dava para continuar assim.

Outro dia encontrei um vizinho de condomínio que tem um Maverick 1976 bem conservado e passei o dedo sob a válvula de máxima do carro dele. Também ficava "minando" gasolina e parece ser um problema comum. Ainda assim, achei melhor consertar isso. Eu já tinha passado algumas vezes, procurando peças, no ferro-velho Auto-Peças Salvação, no setor de oficinas de Sobradinho. E duas ou três pessoas para quem mencionei o problema me disseram que lá nesse ferro-velho o pessoal era especialista em conserto de carburadores. Fui lá conferir.

O seu Nelson, dono do estabelecimento e responsável pelo serviço, não me atendeu de forma muito agradável e, francamente, senti uma bela má vontade dele e do outro funcionário do ferro-velho. Sabe aquele pessoal de comércio que te atende como se estivesse fazendo um grande favor para você? Pois então. Se eu descobrir outra oficina especializada em carburadores em Brasília, não volto mais lá. De toda forma, ele me explicou que, se o que eu queria era só consertar o vazamento na válvula de máxima, ele nem olharia o resto do carburador. Fiquei só nisso mesmo — a revisão completa do carburador ficaria em torno de R$ 160!! Bem, no outro dia estava consertado. Foi feito um embuchamento das roscas que estavam espanadas e foi trocada a tampa da tal válvula, que segundo Nelson era do motor a álcool. Só acho estranho que depois disso o carro voltou a dar aquela "soluçada" quando se enfia o pé no acelerador de vez…

Como desemperrar um cabo de afogador

Padrão

O botão de afogador do meu Maverick praticamente não saía do lugar. Absolutamente travado. Uma inspeção pelo capô mostrava que em um dos pontos a mangueira do cabo do afogador apresentava um amassado considerável. O pior é que o cabo do afogador do Maverick, que compreende o próprio botão em si, não é mais fabricado em lugar nenhum.

Eu até já havia me conformado com a idéia de procurar uma oficina que fabrique cabos sob medida, ou de comprar um desses cabos que a gente vê à venda na Internet — um novo está por algo em torno de R$ 50,00. Mas num domingo de "mexânico" me ocorreu o impulso de desmontar o cabo do afogador e tentar fazer alguma coisa. Desamassar, lubrificar, torcer, sei lá. E não é que deu certo??

 

Desmontagem

Soltar o cabo do afogador do Maverick é moleza: basta um jogo de chaves de boca para porcas. O botão do afogador é fixado na parte inferior do painel, e a porca por trás dele é prontamente acessível. Basta soltá-la. O cabo passa pelo painel corta-fogo (a parede que separa a cabine do motor) pouco acima dos pedais, vai até a frente, dá uma volta de 180 graus para cima, e então a ponta da mangueira do cabo se fixa numa espécie de braçadeira no carburador. O cabo propriamente dito segue até um parafuso com porca que o prende, toscamente, à alavanca que faz abrir e fechar a borboleta responsável por deixar entrar mais ou menos ar no carburador. Afrouxando-se essa porca, o cabo está solto, e basta puxá-lo do painel. Cuidado para não perder a arruela de plástico que fica logo atrás do botão do afogador e a porca que o prende ao painel.

 

Fazendo o cabo se mover

Logo atrás do botão, o cabo do afogador do Maverick tem um cano metálico rosqueado, onde se fixa a porca do painel, e esse cano metálico envolve a ponta da mangueira plástica por onde corre o cabo propriamente dito — na verdade, não é como um cabo de aço trançado, e sim um arame bem grosso, capaz de fazer força "na ida e na vinda" do botão do afogador, sem auxílio de mola.

No meu caso, a mangueira plástica estava solta do tal cano metálico rosqueado. Notei que alguém tentou refazer o encaixe pondo a mangueira para dentro do cano e amassando a ponta (bem porcamente) com um alicate. No meio do amassado, porém, pude ver como era presa a mangueira originalmente — ao redor da ponta desse cano, havia três punções no metal que criavam "pontas" para dentro. Informação útil mais adiante. Além disso, o cabo não se mexia dentro da mangueira. Completamente emperrado.

Comecei por dar umas chacoalhadas no cabo, e apertando levemente com um alicate o ponto lá no meio da mangueira que estava seriamente amassado. Imaginei que lá poderia estar preso o cabo de aço. Tentei girar a mangueira em volta do cabo. Aos poucos, percebi, o cabo começava a se mover.

Então entrou em cena um óleo desengripante em spray — no caso, um genérico do glorioso WD-40. Segurando o conjunto na vertical, borrifei o óleo entre a mangueira e o cabo de aço, bem aos poucos e levemente, para fazer o óleo escorrer por dentro da mangueira. Um pedaço de jornal na mão ajuda bastante, tanto para evitar a melequeira quanto para direcionar melhor o spray. Depois, virei o cabo e borrifei óleo pela outra ponta também.

Batata: quando o óleo começou a escorrer de uma ponta para a outra, foi levando consigo uma bela borra preta, toda a sujeira acumulada em 30 anos de provavelmente pouco serviço. E o cabo começou a deslizar pela mangueira. Segurando-se firmemente a mangueira com uma mão e o botão do afogador com a outra mão, um movimento de vai-e-vem começou a fazer o cabo deslizar dentro da mangueira, de forma progressivamente mais fácil. Mais um pouco de óleo, mais um pouco de empurra e puxa, e pronto — o cabo estava desengripado!

 

Nova fixação

A fase final do serviço era prender a mangueira dentro do cano metálico rosqueado que prende o botão do afogador ao painel. O primeiro passo foi cortar a ponta do cano, que já havia sido bastante amassada em uma vã tentativa de prender a mangueira. Bastava tirar cerca de 0,5cm. Usei uma micro-retífica Dremel com um disco de corte tipo "heavy-duty", mas uma dessas serrinhas amarelas para metal (que algumas pessoas chamam de "cegueta") daria conta do recado. É preciso tomar bastante cuidado e ter a mão bem leve, cortando o metal com suavidade e girando o cano uniformemente, para não deixar que a serra ou o disco de corte atinja o cabo em si.

Para encaixar a mangueira dentro da nova ponta do cano, ajuda bastante usar um estilete para "apontar" a mangueira e facilitar sua entrada. Com a mangueira já dentro do cano, então, usei um prego e um martelo para fazer as punções que prenderiam a mangueira. É difícil fazer a ponta de um prego ficar em pé em cima de um caninho desses, mas pancadas bem leves do martelo já são suficientes para fazer o prego afundar um pouco o cano, sem o furar, apenas o suficiente para criar uma ponta interna que prenda a mangueira.

Depois disso, é só reinstalar o cabo, de dentro da cabine para o capô — primeiro passa-se a ponta sem botão pela arruela de plástico, então pelo painel, e logo em seguida pela porca de fixação no painel. Com um pouco de malabarismo passa-se o cabo por cima da pedaleira e pelo buraco no painel corta-fogo. Então, já pelo capô do carro, é só puxar o cabo, prender a ponta da mangueira no seu respectivo suporte no carburador, e fixar a ponta do cabo na alavanca que faz a borboleta do carburador abrir e fechar.

Pronto! Grande economia! 🙂 

O drama do cilindro de freio

Cilindros de freio - Maverick X Opala
Padrão

A partir dos modelos 1977 o Maverick saiu de fábrica com um novo sistema de freios, de acordo com a revista Quatro Rodas. Servofreio com hidrovácuo Bendix e, seguindo uma regulamentação do Contran, o carro agora tinha, de série, circuito duplo de freios. Disse a Quatro Rodas na época que cada circuito era responsável pela frenagem das rodas de um dos lados do carro. Bem, pelo que eu pude ver acompanhando o caminho dos canos dos freios, isso foi um erro — na verdade, um circuito cuida das rodas traseiras e outro das dianteiras.

A chave do funcionamento do circuito duplo de freios está no cilindro-mestre. Ele fica embaixo do reservatório de fluido de freio (que é encaixado nele) e, basicamente, é um cano de metal que funciona como uma seringa. Dentro dele corre um êmbolo que, quando acionado pelo pedal, empurra o fluido do reservatório para os freios das rodas, por meio de canos que são encaixados em saídas laterais no cilindro. Os primeiros sistemas de freios hidráulicos tinham uma só dessas saídas — e quando havia algo de errado no sistema, o carro ficava totalmente sem freio! Daí foi criado o circuito duplo, em que o cilindro-mestre tem duas saídas de fluido e o êmbolo também é duplo, criando assim saídas independentes que permitem que pelo menos metade do sistema continue funcionando, caso haja uma falha ou vazamento na outra metade.

 

Espécie em extinção 

Por incrível que pareça, ocorre que o moderno cilindro-mestre duplo adotado pelo Maverick a partir de 1977, especificação Bendix 2257468, mostrou-se muito mais difícil de encontrar do que o cilindro usado anteriormente, que é de circuito simples e é caracterizado por ter, em vez de um reservatório plástico para o fluido, um copão de metal com tampa na ponta. É que esse mesmo modelo de cilindro era também usado pelas populares F-100, F-75 e Rural.

E achar o cilindro duplo do Maverick não foi, na verdade, muito mais difícil — foi simplesmente impossível. Nenhum outro carro brasileiro usou um igual e ele não existe mais no catálogo dos fabricantes de freios. Não consegui encontrar nas tradicionais lojas de peças antigas de Brasília, como a Ipanema e a Induspina, e nem mesmo em sites especializados em peças para Maverick, como o Maveco.com.br, que até tinha um modelo duplo, mas para carros sem o hidrovácuo. Não foi possível nem mesmo encontrar o reparo dele (para quem não é iniciado no assunto, reparo é o jogo de borrachas de vedação do cilindro e do êmbolo interno, além de molas e outras pecinhas).

Tentei o recondicionamento do cilindro original, em uma oficina especializada em freios. Os mecânicos até disseram que não seria problema adaptar o reparo de outro modelo, desde que o cilindro não estivesse comprometido demais… e estava. A desmontagem do conjunto revelou que o cilindro estava arranhado e gasto por dentro, e um polimento não adiantou muito. Mas pelo menos o mecânico que me telefonou para dar essa má notícia me ofereceu uma luz no fim do túnel — uma boa dica para adaptação de um outro modelo de cilindro.

 

A gente se vira como pode

Por muito pouco eu já não tinha partido para a remoção completa do hidrovácuo e do cilindro originais. Na busca do cilindro, descobri um mecânico que já tinha adaptado em vários Mavericks o cilindro-mestre da F-1000, sem hidrovácuo, do modelo usado até 1986. A mão-de-obra ficaria em R$ 120,00 e ele garantiu que a falta do hidrovácuo não faria o sistema ficar "pesado" demais. Além do mais, na excelente comunidade do Orkut "Maverick – Algumas adaptações", eu já tinha lido sobre esta adaptação do cilindro da F-1000 e também muitos relatos de gente que instalou com sucesso (mas também com um certo trabalho) o hidrovácuo e o cilindro da picape Pampa.

Dois dos membros da comunidade tinham mencionado, sem detalhes, que tinham adaptado o cilindro-mestre do Opala com muita facilidade — e foi essa a dica que o mecânico especialista em freios me deu. "Compra o cilindro do Opala 86! Foi usado entre 1982 e 1988, eu acho. Mas tem que ser o cilindro pra sistema Bendix, porque nessa época também tinha o Varga. Você só precisa trocar os conectores dos canos de freio, que são os mesmos do Fusca, do Monza, de uma porrada de carro. O hidrovácuo do Maverick era o mesmo, ele vai encaixar direitinho!"

Como o Opala foi muito mais vendido, e por muito mais tempo que o Maverick, encontrar peças para ele é bem mais fácil — mas nem tanto. Das lojas que pesquisei, só uma tinha o dito cilindro para pronta-entrega, por R$ 190,00, da marca Bosch, modelo 2262124 / CM2124. Tente encontrar o modelo que já vem com o reservatório de fluido (daqui a pouco você vai ver por quê). Também encontrei, mas não para pronta-entrega, cilindros iguais das marcas Controil e Power, ligeiramente mais baratos (mas achei melhor não arriscar). E precisei rodar feito um corno para encontrar os malditos e imbecis conectores (para os brasilienses: na Detroit Autopeças, na 710 Norte, virada para a W-3), por R$ 1 cada.

Na foto ao lado, estão o cilindro original do Maverick (mais escuro) e o CM2124 do Opala. O cilindro original tem 16cm de comprimento e o do Opala é cerca de 1cm maior — se fosse meio centímetro maior, não se encaixaria no exíguo espaço entre o hidrovácuo e a coluna de suspensão do Maverick. A distância entre os furos de fixação no hidrovácuo é a mesma, de 9cm. A diferença mais evidente está no diâmetro dos furos para encaixe do reservatório de fluido. Tentei a solução picareta de encaixar as borrachas de vedação do reservatório do Maverick dentro dessas do Opala — encaixam direitinho, mas não funciona. Por isso é recomendável comprar o cilindro que já vem com o reservatório (o que eu NÃO fiz), ou comprar o reservatório separado. Levei o cilindro a um ferro-velho e encontrei dois reservatórios Bendix que encaixaram perfeitamente. Comprei um por R$ 10,00.

  Cilindros de freio - Maverick X Opala
Conector de tubo de freio

 Note ainda que no cilindro do Maverick uma das saídas de fluido é maior que a outra, enquanto no Opala as duas são pequenas. É por isso que é preciso adaptar um novo conector no duto de freio que se encaixa mais à frente do cilindro. O conector em questão tem exatamente 10 milímetros de diâmetro na rosca.

A adaptação 

O primeiro passo depois da desmontagem do cilindro original é trocar o conector do cano de freio que fica mais à frente do cilindro-mestre e é responsável pelos freios dianteiros. Para trocar o conector, é preciso cortar a ponta do duto de freio, tirar o conector antigo, colocar o novo, e alargar a nova ponta do cano para que ela não deixe o conector sair. Para isso se usa uma ferramenta especial, meio cara, mas não incomum — consiste em um suporte para segurar o cano e uma espécie de parafuso com uma ponta lisa e cônica bem rombuda que vai arregaçando o cano. A liga metálica usada na fabricação dos canos de freios originais do Maverick é muito dura, bem mais que os caninhos de cobre usados atualmente, e por isso essa operação de alargamento da ponta é mais trabalhosa e deve ser feita com cuidado para não rachar o metal.

Como já foi dito, o espaço entre o hidrovácuo e a coluna da suspensão dianteira esquerda do Maverick é pífio. O cilindro do Opala cabe JUSTINHO nesse espaço, sem um milímetro de folga. Mas do cilindro ainda sai um caninho que deve ficar dentro do hidrovácuo — é o eixo dos êmbolos internos, e para a colocação do cilindro, é preciso serrar a ponta desse caninho, algo entre 1cm e 1,5cm. Como o hidrovácuo tem um pino que fica dentro desse caninho e o empurra para dentro, a parte serrada não deverá fazer falta.

Feito isso, é só encaixar o reservatório (usar um WD-40 ou equivalente facilita o encaixe nas borrachas e evita quebra dos encaixes do reservatório), encher de fluido e fazer a sangria do sistema. Depois disso, o freio deve funcionar normalmente, parando o carro com vigor e facilidade se o hidrovácuo não estiver com problemas. No meu caso só não está 100% porque uma das pinças está com o sangrador quebrado e um dos parafusos de fixação do cilindro-mestre está um tanto espanado. E ainda dei um azar danado porque o cilindro que eu comprei primeiro veio com defeito e precisei trocar na loja. Mas se esta dica de adaptação for útil a mais alguém, por favor me avise que eu vou gostar de saber!